sexta-feira, 25 de abril de 2008

Capítulo Dois

Ainda no espírito 'Recordar É Viver' ...
segue aqui o capítulo 2 da saga ao Alaska em maio de 2007.

UMA CARIOCA NO ALASKA
Capítulo 2 => DALLAS

Escrevo de Fairbanks.
Estou em escala de uma hora dentro de um avião da Alaska Airlines a caminho de Barrow.
Do alto não consegui ver a cidade direito.
O aeroporto, que é de cimento mas lembra um grande container horizontal, não parece tão grande quanto o de Anchorage.
Também não deve ser muito acolhedor.
A aeromoça disse que quem quisesse até podia descer, era só mostrar o boarding pass na volta.
Mas ninguém se animou.
Por conta disso, eu também não.
É que estou começando a conhecer o povo do Alaska.
E estou gostando.
Aqui o importante é apenas o essencial.
E isso é bom.
Portanto se meus companheiros de vôo não desceram é porque no fundo não deve mesmo haver nada de importante pra se fazer no aeroporto de Fairbanks.
Prefiro ficar no avião e continuar blogando a viagem.
Está me fazendo bem dividir as impressões com vocês.
Em 24 horas, saí do Brasil após um dia exaustivo de correria, cartório, engarrafamento na 9 de julho, obra no apartamento, demandas no trabalho, prestação de contas, táxi quebrado na Marginal Tietê, embarque no GRU com fome, louras de Miami, detenção na imigração e chegada ao curioso mundo de Dallas, onde só estive antes uma vez, em janeiro de 1990, quando atravessei o sul dos EUA de ônibus.
Vista de baixo, Dallas é uma coisa.
Do alto parece outra cidade.
Me lembro, na tal viagem, de ter ficado muito impressionada com os prédios com mais de cem andares espelhados em vidro.
Da janela do ônibus eles pareciam ameaçadores e a única coisa que me vinha à cabeça era a música de abertura do seriado em que aprendi a amar meu primeiro vilão, J.R., o simpático marido da Jeannie – a geniazinha.
Dezessete anos depois, da janela do avião, os prédios parecem apenas ridículos.
Monstrengos de aço e vidro reunidos em downtown.
Nenhuma personalidade.
Não que a cidade me pareça freak.
Deve ter algum desafio morar num lugar plano, onde ao longe se avistam coisas esquisitas.
Dallas é reta, esparramada.
Tudo é longe e distante ligado apenas por longas avenues e roads.
Desembarco no terminal D, um lugar colorido. cheio de lojas, letreiros e lugares pra comer tipo Friday’s, incluindo o próprio.
São cinco horas de escala e estou bem cansada.
Mas não desisto do plano inicial de ir até a Apple Store da cidade comprar meus gadgets.
Pego um táxi e vou até o North Park.
Se as cidades americanas têm sempre um mall gigante, imaginem Dallas.
O North Park é tão grande que nem o motorista local sabe onde me deixar.
Fico na entrada da Victoria’s Secret.
Como já tinha estudado as directions no Brasil, não me incomodo.
E, em caso de dúvida, lá está o mapa do shopping à minha frente.
A bolsa está pesada e eu me arrasto – afinal já são mais de 30 horas de atividades – mas sei que basta procurar a Neiman Marcus que eu acho a loja.
Acostumada às Apple Stores de NY, acho a de Dallas até pequena.
Sei lá, no Texas, sempre acho que tudo vai ser gigante, ostensivo.
Mas a loja é normal, nem das maiores nem das menores do shopping.
Os geniuses são os mesmos, mas me chama a atenção eles não serem tão robóticos quantos os colegas new yorkers.
Há até entre eles uma mulher na meia-idade.
Cool, penso eu, no Texas pra ser wiz-kid-computer não precisa ser nerd-clichê.
No caixa, os atendentes são simpáticos e elogiam uma foto da Bahia que levo América acima no meu velho MacBook.
Arrebato as sonhadas comprinhas e saio me arrastando pelo mall, com mais peso ainda.
Não é lá muito inteligente fazer compras de viagem antes de ir pro Alaska, mas apesar de ter prevista na volta uma escala de 12 horas na mesma Dallas, decido comprar tudo logo com medo de depois não ter ânimo pra encarar a ‘sacolagem’.
O shopping gigante não me entusiasma.
As lojas de sempre, Neiman, Nordstrom, Abercrombie & Fitch, Fossil, Diesel.
Entro apenas na Macy’s pra comprar um creme que esqueci no banheiro do aeroporto de Miami.
Uma Macy’s vazia numa tarde de terça-feira é sempre triste.
Grandes lojas de departamento só fazem sentido cheias.
Imagine andar por uma Bloomingdale’s às moscas.
Já me aconteceu, em NY, por conta da ressaca pós Black Friday + o pouso da águia da economia americana.
Dá até medo.
Parece aqueles filmes em que você se imagina trancado sozinho no museu à noite.
Talvez por isso as moças do balcão da Estée Lauder me atendem com uma simpatia tão esfuziante que enche um pouco o saco.
Não tem o creme que quero, mas as duas fazem um jogral tão insuportável que eu aceito um de outro tipo só pra poder sair dali correndo.
Pra aumentar ainda mais o peso da minha sacola ganho uma gift bag com mais tranqueira pra botar no saco que zipa tudo na segurança dos tantos aeroportos que ainda terei de encarar.
Mas foi no balcão da Macy’s que entendi o poder da palavra A-l-a-s-k-a.
Acreditem-me, é um nome mágico, forte e poderoso.
Faz qualquer pessoa te olhar, finalmente, com atenção.
Experimente um dia dizer pra alguém em tom casual, ‘Estou indo pro Alaska’.
Pronto, subitamente os olhos das pessoas brilham como se elas estivessem frente alguém que, puxa vida, pelo menos um de nós vai realizar algum sonho.
Foi o que aconteceu com todo o balcão da Macy’s.
As moças do jogral me perguntaram se eu era de Dallas.
Pergunta ligeiramente estúpida, penso eu agora, porque se eu fosse de lá mesmo por que diabos estaria com uma bolsa de viagem tão grande.
Implicância minha ?
Não sei, vai ver eu estava irritada de cansaço, jet lag e peso.
Vai ver estando já há algumas horas no Alaska, onde escrevo este texto, já incorporei o modus operandi do não-percamos-tempo-com-o-que-não-é-realmente-útil.
Sei que quando respondi que ia pro Alaska, vi bocas pintadas de vermelho se abrirem no tradicional ‘Oh, wow’.
As moças ficaram mais simpáticas ainda e eu decido sair correndo da loja pra ainda tentar achar uma de cameras fotográficas.
Ninguém sabe dizer uma.
Entro até num estúdio fotográfico e ninguém consegue dizer.
Incrível, penso eu, estão todos os dias num shopping mas não sabem o que tem lá.
O grupo que me dá atenção no estúdio é de texanos típicos.
Simpáticos profissionais.
Fingem que estão realmente empenhados em me ajudar mas, who cares, o problema é meu, não deles.
Devo estar irritada mesmo, por que noto ou invento da minha cabeça um certo ar de desdém da parte deles.
Enfim, desisto de achar a tal loja e peço um taxi de volta ao DFW.
O motorista vê meu jeito despachado e quer puxar conversa.
Pergunta de onde sou, respondo que do Brasil, e ele começa com a tradicional conversa, ‘puxa, adoro o Brasil’.
Mas é que estou cansada demais, só digo ‘nice’ e volto ao earphone do Ipod - aparato fantástico pra alguém dizer ‘me deixe só’.
Uma pena, adoraria saber as histórias de um cab driver texano.
Fica pra próxima.
Porque sempre acredito que haverá uma próxima.
O primeiro passo é querer.
Um beijo,
Guta





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