domingo, 30 de novembro de 2008

O Caso Megan Meier

Durante a semana não se falou em outra coisa na cybersphere.
O julgamento de Lori Drew.
A mãe, de 49 anos, que criou um perfil fake no MySpace para interagir com Megan Meier, uma menina de 13 anos, ex-amiga de sua filha.
Em setembro de 2006, Lori, com a ajuda de uma assistente de trabalho de 18 anos, criou o perfil de Josh Evans, um suposto novo morador da vizinhança, de 16 anos.
"Josh" se aproximou de Megan via website.
Disse que seus pais não tinham telefone e que ele não ia à escola, estudava em casa, por isso conversariam apenas pela internet.
Viraram 'namorados virtuais'.
Semanas depois "Josh" começou a agredir Megan com críticas online, o famoso cyberbullying.
Em 16 de outubro de 2006, "Josh" teria terminado o namoro com Megan pela internet.
Teria escrito que "o mundo seria um lugar melhor sem ela [Megan]".
Horas depois a menina foi encontrada pela mãe, enforcada com um cinto, pendurada no closet.

Daí para frente começou o circus que acompanha os casos na justiça.
E a discussão na blogosfera.
Esta semana Lori Drew, a mãe, após um julgamento de cinco dias, foi declarada culpada de três crimes, entre eles, a criação de uma identidade falsa na internet para ferir Megan Meier emocionalmente.
Foi absolvida da quarta acusação, conspiração criminal.
O juiz alegou 'mistrial' - julgamento incorreto.
A sentença ainda não saiu.
Lori Drew poderá pegar três anos de cadeia e pagar multa de até 300 mil dólares.
A defesa pede novo julgamento.

O furor daquele que está sendo chamado de primeiro julgamento de cyberbullying se explica com as inúmeras variáveis do caso.
Há gente discutindo por que o julgamento foi em Los Angeles, na Califórnia, se o caso aconteceu no Missouri.
A razão alegada é que a sede da empresa do MySpace fica em Beverly Hills.
O procurador federal dos EUA, em Los Angeles, tomou a frente do caso pessoalmente [com mais dois assistentes] depois que a justiça do Missouri decidiu que a mãe não tinha infringido nenhuma lei estadual.
Esta semana, depois de uma onda de revolta, posts e e-mails indignados de tudo quanto é parte do mundo, o conselho local dos vereadores do condado onde ocorreu o caso aprovou uma lei que faz do assédio pela internet um delito passível de multa de US$ 500 e até 90 dias de prisão.
Segunda a prefeita do condado, tinha gente querendo queimar a casa de Lori Drew.
Depois da divulgação do caso houve de tudo.
Passeata em frente à casa deles, objeto atirado contra a casa, divulgação na internet de fotos da família - até fotos da casa, vista do Google Earth.

Na mídia há um confronto de informações que deixa assustada qualquer pessoa que decida ler um pouco mais sobre o assunto.
Cada um relata o caso conforme quer, incluindo informações não-confirmadas e/ou omitindo outras.
Já li de tudo.
A mãe dizendo que inventou o perfil de Josh depois que a filha e Megan brigaram. Segundo esta versão, Megan teria passado a falar mal e inventar boatos sobre a filha dela na cidade onde moram.
As duas famílias vivem a 4 casas de distância.
A mãe, então, teria criado o perfil para interagir com Megan e descobrir o que a adolescente falava da filha.
Há reportagens que falam que o plano das Drews era um dia levar Megan ao shopping e humilhá-la revelando na frente de todos os amigos da escola que o namorado virtual dela não passava de um fake do MySpace.
Tem matéria que não entra na discussão porque Lori, a mãe, não foi indiciada com o crime de levar a garota ao suicídio.
Tem jurista dizendo que se criar perfil fake for crime, milhões e milhões de pessoas em todo o mundo estão cometendo crimes diariamente.
A defesa de Lori chegou a alegar que ela não leu com atenção as regras que o MySpace pede para o usuário concordar na hora de abrir a conta.

Há reportagens que não citam que Megan, a vítima, era tratada de DDA e tomava anti-depressivos.
Há também quem não registre que logo após receber a mensagem do falso "Josh", Megan teria escrito "você é o tipo de garoto pelo qual uma garota se mataria".
Há também matérias que não discutem porque Ashley Grills, a jovem, hoje com 20 anos, que ajudou Lori a criar a conta do falso perfil, conseguiu imunidade para testemunhar no caso.
Alguns veículos dizem que ela ganhou imunidade para testemunhar contra Lori Drew.

E durante toda a cobertura, desde que o caso ganhou repercussão há um ano, foi assim.
Tem matéria que diz que nas últimas horas, quando "Josh" começou a insultar Megan, a menina passou a trocar xingamentos com ele numa escalada de agressividade.
Uma matéria do NYT lembra que Lori Drew, a mãe, já tinha levado Megan numa viagem a passeio, e, por isso sabia que a menina tomava medicação anti-depressiva.
Há depoimentos [sem fonte declarada] de que Lori teria contado a uma outra menina da vizinhança o que estava fazendo com Megan no MySpace.
A mensagem mais agressiva do falso "Josh" para Megan teria sido "não gosto da maneira pela qual você trata seus amigos, e não sei se quero continuar sendo seu amigo".
A partir daí outros usuários que tinham links para o perfil de Josh teriam aderido à discussão e também teriam enviado mensagens ofensivas à Megan.
Mas ninguém explicou direito quem eram esses usuários linkados à Josh.
Sabiam que ele era um 'fake'?
Faziam parte de um grupo que queria 'zoar com Megan'?

E tem mais.
Segundo a vizinha [fonte não-declarada], mãe da menina para quem Lori teria contado a história, enquanto os paramédicos tentavam reavivar Megan, Lori teria ligado para a filha dela mandando a menina calar a boca sobre a história da página do MySpace.
Mas seis semanas depois a vizinha teria contado a história aos pais de Megan.
O surreal é que pouco antes da morte da menina, Lori Drew tinha pedido à mãe de Megan para guardar na casa delas uma mesa de sinuca que ela e o marido tinham comprado de presente para os filhos e queriam fazer surpresa.
Quando descobriram o caso, os pais de Megan destruíram a mesa a machadadas e a deixaram aos pedaços na porta da casa dos Drew.
O caso todo só foi parar na polícia porque Lori Drew abriu queixa contra os Meiers na delegacia.
Em seu depoimento, Lori teria dito que achava que sua brincadeira podia ter contribuído para o suicídio, mas afirmava não se sentir 'tão culpada' porque no velório de Megan teria descoberto que a menina já havia tentado suicídio antes.
A mãe de Megan nega.
Diz que a filha já havia falado sobre suicídio antes mas nunca havia feito nenhuma tentativa.
Segundo ela, ninguém que conhecia a menina, incluindo seu médico, a considerava como potencialmente suicida.
Há ainda versões de que, momentos antes de se matar, Megan teria comentado com a mãe sobre as ofensas que vinha recebendo.
A mãe a teria criticado, principalmente, pelo uso de termos vulgares na briga com o "rapaz" pela internet, e por não sair da internet quando a mãe mandava.
Megan teria subido chorando para o quarto, dizendo algo na linha 'você é minha mãe e o certo seria ficar ao meu lado'.

Ou seja, entre verdades, mentiras, fatos confirmados e outros não, há muito o que se pensar.
O caso ficou tão famoso que foi criada uma página na Wikipedia, Suicide of Megan Meier.
Lá há links para várias reportagens sobre o assunto, de onde foram tiradas as informações.
Assim como nos jornais, resta a dúvida.
Qual o ponto de vista de quem escreveu o texto da Wikipedia?
Não é referência isenta.
Podemos ler mas não tomar como o viés da história.

O fato é.
Uma menina de 13 anos se suicidou.
E isso é muito triste.

Outro fato.
O caso Megan Meier abre uma precedência jurídica sobre a internet.
Há juristas defendendo e criticando as decisões tomadas ao longo de todo o caso e elas vão pautar várias ações daqui para frente.

Como juiz eu, particularmente, não conseguiria julgar o caso.
Suicídio é um tabu emocional.
Há culpados?
A vítima é culpada?
Ninguém é culpado?
Todos são culpados?
É um caso de culpa?
Responsabilidade?

Lendo de tudo um pouco sobre o assunto, tendo a concordar com Danah Boyd, especialista em redes sociais.
Há um post no blog dela sobre o caso.
Não acho que as redes sociais - com todas as suas possibilidades - possam ser culpadas.
Ao se discutir a responsabilidade da tecnologia, no caso o MySpace, estamos deixando de discutir algo muito mais doloroso.
As relações em que ocorrem os 'bullyings'.
Vivemos e convivemos com casos de abuso emocional a torto e à direita ao nosso redor.
Abuso emocional nas relações de pais e filhos, chefes e empregados, amigos de escola, de emprego, no dia-a-dia da sociedade dividida em castas de profissões.

Minha única certeza é a de que é muito triste que a morte de uma menina seja a catarse de todo o buraco negro emocional em que vivemos.
Cada um que pense na morte de Megan Meier ao seu modo.
Mas pense.

2 comentários:

Anônimo disse...

pow cara essa é uma das melhores reportagens sobre o caso que axei na net, farei um trabalho no colegio sobre este caso, e aki axei muita informação vlw msmo... abraço

Brava Malvada disse...

Nossa! Excelente :D