Os prisioneiros da foto estão mortos.
São apenas alguns entre mais de 1 milhão e 700 mil pessoas torturadas e executadas pelo Khmer Rouge em 4 anos, de 1975 a 1979, no Cambodja.
As fotos foram tiradas por Nhem En, fotógrafo oficial da prisão Tuol Sleng, a mais temida casa de tortura do regime de Pol Pot.
Em meio a gritos lancinantes ele metodicamente fazia seu trabalho.
Fotografar os prisioneiros do Khmer.
Quando as vítimas chegavam, seu trabalho era remover-lhes a venda dos olhos, ajeitar o ângulo das cabeças para a foto e 'click'.
Elas ainda não sabiam.
Mas ele sim.
Elas iam ser mortas.
Agora, o fotógrafo vai ser testemunha no julgamento dos líderes do Khmer Rouge.
Entre eles, seu antigo comandante, um cambodjano conhecido como 'Duch', preso e acusado de crimes contra a humanidade.
Por ocupar uma posição subalterna de baixa patente, o fotógrafo não será preso.
Mas é só ler a matéria do The New York Times para ver o quanto ele se orgulhava de fazer seu serviço bem feito.
E não despertar a ira do comandante.
Diz que por ser limpo e organizado, ganhou até um Rolex do chefe.
Quando o Vietnã invadiu o Cambodja, em 79, fugiu com os colegas.
Conta que trocou o Rolex por milho moído.
Sobreviveu, prosperou e continou se articulando ao poder.
Hoje em dia é político, do partido do primeiro-ministro.
Chega a usar um relógio de pulso com retratinhos do primeiro-ministro e da esposa.
A carreira no Khmer Rouge começou cedo, aos 9 anos, quando foi recrutado no campo para tocar bateria numa 'banda revolucionária'.
Diz que quando tinha 16 anos foi enviado à China para um curso de fotografia de 7 meses.
Se tornou o chefe de 6 fotógrafos na prisão, onde 14 mil pessoas foram torturadas até a morte ou enviadas para campos de execução.
Conta que quando desvendava-os, os prisioneiros gritavam, 'por que estou aqui ?', 'o que eu fiz ?', 'do que sou acusado ?', 'o que fiz de errado ?'.
E Nhem En os ignorava.
'Olhe fixo para a frente.
Não mova a cabeça nem pra esquerda nem pra direita'.
Era tudo o que dizia.
De lá eram levados para o interrogatório.
Hoje em dia, há fotos de Nhem En espalhadas por galerias de arte nos Estados Unidos.
Centenas estão penduradas nos corredores da prisão, transformada em museu.
Não deve ser fácil caminhar por entre essas paredes.
E olhar nos olhos desses olhares fixos.
Que, sem ainda saber, fitavam a morte.
Nos olhos de um fotógrafo.
Registrada numa lente.
Para sempre numa fotografia.
domingo, 28 de outubro de 2007
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